Tinha em mente quatro opções de temas para trabalhar neste artigo:
1) o reconhecimento de Arturo Saboia e seu filme, "Acalanto". Pensei em resgatar o cinema maranhense desde os idos da geração 70; evidenciar como temos expertise nessa
área, desde Euclides Neto, Murilo Santos, até, mais recentemente,
Frederico Machado, Francisco Colombo e Arturo Saboia, para ficar nesses
nossos bravos ícones do fazer vídeo e cinema no Maranhão. "Acalanto" é
mais uma evidência de nossa competência, mas também exemplo da duríssima
vida daqueles que optam por fazer cinema, num estado onde se prefere
patrocinar com 12 milhões de reais a Beijar-Flor, no carnaval carioca, a
abrir um edital de apoio ao cinema e vídeo maranhenses;
2) a reintegração do professor Ayala Gurgel ao quadro docente da UFMA. Mostrando, no exemplo da professora Sirleane Paiva (única a votar contra sua exoneração no Conselho Universitário), como uma andorinha só fez verão contra o autoritarismo do reitor Natalino Salgado;
3) o alerta aos concurseiros de plantão sobre o engodo do edital ao "concurso" do Hospital Universitário.
Leram o edital item a item, caros concurseiros? Viram em algum deles
por quanto tempo vocês ficaram empregados na EBSERH? O prazo de validade
do seletivo? Não estranharam que o estágio probatório (de dois anos,
quando se presta concurso públicode verdade ao
serviço público) foi reduzido a um contrato experimental de 90 dias?... E
os colegas jornalistas, observaram que a nossa carga horária de 5 horas
de trabalho diária foi totalmente desrespeitada? Além de outros pontos,
pretendia evidenciar como esse falso concurso ao HUUFMA trata-se do
principal passo rumo à privatização do Hospital Universitário via EBSERH
e chamar o Ministério Público Federal à atuação imediata;
4) a Jornada Internacional de Políticas Públicas.
Por fim, estava inclinado a escrever sobre como a jornada organizada
pelo Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas (UFMA), para além
de seu êxito organizativo, trouxe ao Maranhão não só dos melhores
intelectuais do mundo e do país, mas o que de melhor se tem de análises
sobre o momento pelo qual passa nossa sociedade...
A
dúvida em torno do que escrever desapareceu diante de um tema que
sequer cogitei articular: o falecimento do Padre Victor Asselin, em
consequência de um câncer contra o qual lutava há dois anos. Ele partiu
nas primeiras horas do dia 23 de agosto.
Victor
Asselin não foi apenas mais um padre estrangeiro que se tornou
maranhense ao vir para o nosso estado. Canadense, ele chegou por cá em
1966. Desde então, tornou-se a principal referência do estudo, da
organização e da luta pela terra no Maranhão.
Asselin
foi fundador da Comissão Pastoral da Terra (CPT), tendo participado do
encontro que criou a entidade, em 1975, em Goiânia. Da CPT, foi seu
primeiro vice-presidente nacional e primeiro presidente no Maranhão.
Ao
pesquisar sobre o que estava por trás de tanta violência aos camponeses
e camponesas maranhenses, descobriu uma ampla rede de grilagem (grilar -
fazer títulos falsos de posse da terra) que envolvia corrupção, poderes
constituídos e políticos do Estado. Sua pesquisa transformou-se no
livro "Grilagem: corrupção e violência em terras do Carajás" (de 1982),
reeditado em 2009, pelo qual recebeu como "prêmio" uma espécie de exílio
do Maranhão, onde sequer pôde fazer a divulgação do livro, jurado de
morte que foi por poderosos e grileiros. Como observa o historiador
Carlos Leen Santiago, o livro do Pe. Victor está para o Maranhão como
"Veias Abertas", de Eduardo Galeano, está para a América Latina: desnuda
a realidade estrutural maranhense a fundo, por isso permanece tão atual
e de imprescindível leitura.
Até
os últimos dias no Maranhão, Pe. Victor foi coerente pela opção que fez
pelos mais pobres e camponeses. Lembro que, mesmo muito educado, não
deixou de dar uma descompostura numa antiga conhecida sua que havia
aderido ao sarno-petismo: ao pedir sua benção, disse a ela: "Não, eu não
te abençoo!"... Pe.Victor não compreendia como petistas tão vinculados à
luta dos trabalhadores rurais tinham baixado a cabeça para a oligarquia
que tanto assassinou camponeses maranhenses.
Por
essa sua coerência, foi um dos primeiros a colocar-se ao lado de
Jackson Lago na defesa de seu mandato contra o golpe judiciário
orquestrado pela oligarquia, ocorrido em abril de 2009. Advogado, também
foi um dos primeiros a subscrever a ação judicial que as organizações
populares preparavam para pedir a cassação do mandato de Roseana Sarney,
eleita governadora sob amplo abuso de poder econômico, em 2010.
Asselin, como símbolo da CPT e da luta pela reforma agrária, assinaria o
documento juntamente com Pe. João Maria Van Dame, referência da ASP na
luta pela saúde pública, e Ricarte Almeida, expressão da Cáritas na luta
por políticas públicas e transparência no orçamento.
Em novembro de 2010, quando nos encontramos na solenidade de outorga de título de doutor honoris causa a
Manoel da Conceição, na UFMA, ele me dizia que o exemplo que "Mané" nos
dava era o da convicção, de não baixar as bandeiras, de manter a
resistência sem medo. Até o último momento que pôde, Victor Asselin não
tergiversou em estar ao lado da justiça, da paz e pela vida.
Nos
movimentos sociais, quando queremos exaltar uma pessoa querida e
importante que se foi, mas deixa a marca de sua atuação, de suas ideias e
ideais, grita-se bem alto o nome dela e, mais alto ainda, a palavra
PRESENTE, para significar que sua luta prosseguirá pelos que aqui ficam.
Sobre
o Pe. Victor Asselin, não há outra coisa a fazer em sua homenagem que
não alçá-lo ao topo dos ícones da luta por um Maranhão livre.
- Maria Aragão: presente!
- Neiva Moreira e Jackson Lago: presentes!
- Padre Josimo e Magno Cruz: presentes!!
- Padre Victor Asselin: PRESEEENTE!!!!
(*) Franklin Douglas - jornalista, professor e doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 25/08/2013, p. 12).
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