De atuação enérgica no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) já se mostrou capaz de causar incômodos ao governo. Oposição ao governo Dilma Rousseff, se destaca pela retórica e pelo perfil combatente.
Mas
já causou polêmica em seu partido ao se aproximar do DEM nas eleições
de 2012 para a prefeitura de Macapá, o que levou a ser rotulado como
líder da “ala light” do PSOL.
Atento
aos direitos humanos e às reivindicações populares, agora é candidato à
Presidência, após ter derrotado a ex-deputada gaúcha Luciana Genro na
pré-convenção da sigla. A ZH, indica que a reforma agrária e a tarifa
zero no transporte, subsidiada por aumento de imposto, serão suas
bandeiras.
Zero Hora — Quais serão os eixos da sua campanha?
Randolfe Rodrigues — Pensamos
em uma campanha identificada com o que veio das ruas, com as
reivindicações de junho. Existe uma pauta de direitos sendo clamada pelo
povo. E isso não está sendo satisfeito pelos governos, especialmente o
federal. As outras candidaturas colocadas (Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos) se
preocupam mais em agradar ao mercado, aos financiadores, do que atender
os investimentos em saúde, educação, mobilidade e reforma agrária.
ZH
— O PSOL, que esteve na origem de algumas manifestações, como no caso
de Porto Alegre, tentará se apresentar como um dos propulsores dos
movimentos de junho?
Randolfe — Ninguém
pode ter a arrogância de se dizer titular das mobilizações. Ninguém
pode se apoderar. Aqueles que acham que o mais importante são as obras
monumentais da Copa, creio que não poderão falar em nome do que ocorreu
no Brasil.
"As
mobilizações de junho foram muito maiores do que qualquer partido. Na
campanha presidencial, vamos ver quem terá legitimidade para falar" —
Randolfe Rodrigues.
ZH — O senhor apresentará propostas reivindicadas nas manifestações, como transporte gratuito?
Randolfe — O
passe livre é exequível. O problema é que a presidenta disse que queria
dialogar com as manifestações e, depois, esqueceu. Qual é a lógica
dessa proposta? Quem tem mais, paga aos que têm menos. É a proposta de
inversão no IPTU. A União pode fazer isso? Não. Mas pode induzir a isso.
Falei a presidenta que ela tinha de enfrentar a máfia do transporte
coletivo.
ZH — Para adotar a tarifa zero, o senhor sugere aumento de IPTU?
Randolfe — Precisaria
de uma política progressiva. Isso é uma medida adotada na Europa. Os
locais da cidade de melhores condições aportam recursos para que quem
tem menos condições possa ter transporte coletivo.
ZH — Como avalia os movimentos de Eduardo Campos e Marina Silva, que se apresentam como novidade em uma terceira via?
Randolfe — O Eduardo, com todo o respeito, não é o novo. O partido do Eduardo está na política desde 1946. O avô (Miguel Arraes) representa
um setor da política que existe desde a época da ditadura. O Eduardo e o
PSB estiveram na coalizão que governa o país. Ele poderia ter feito
essa ruptura com o governo (Dilma) há mais tempo. A maior parte do partido dele está com o agronegócio, votou contra o código florestal no Congresso.
"A
Marina, se refletisse um pouco mais, deveria votar na gente, votar em
mim. Eu que estive no Congresso defendendo um código florestal
verdadeiro. O novo nessa eleição é o PSOL" — Randolfe Rodrigues.
ZH
— O PSOL, por vezes, é apontado como partido que quebraria a economia
justamente pelo discurso radical contra setores que representam
importante fatia do PIB, como o agronegócio. Como avalia?
Randolfe — Essa
turma leva o Brasil a estar há 20 anos sob a maior taxa de juros do
planeta, as famílias a serem as mais endividadas da America Latina. A
taxa de juro está nos levando a reprimarização da economia. Temos uma
pauta de exportações que é a mesma dos anos 1960. Estamos nos
transformando em uma enorme fazenda de soja em vez de sermos potência
industrializada. E somos nós que vamos transformar o Brasil em um país
economicamente ingovernável? São eles que estão fazendo isso. Queremos
que o país volte a ser um exportador de produtos manufaturados.
ZH — Para enfrentar a inflação, qual seria o remédio adequado?
Randolfe — Primeiro,
baixar os juros. Outro mecanismo é fazer a reforma agrária. Parte da
inflação é causada pelo preço dos alimentos. Não podemos ser o país do
latifúndio. O produto tem de chegar à mesa sem especulação. A América
toda já fez a reforma agrária. Só aqui neste país que não foi feito. Só o
presidente gaúcho chamado João Goulart teve coragem de anunciar. E por
isso foi golpeado. Tem de ter a coragem do Jango, que disse que os
latifúndios improdutivos à beira de estrada estavam desapropriados.
ZH — A sua reforma agrária seria com pagamento de indenização?
Randolfe — Vou cumprir o que está na Constituição, que reza claramente: a terra tem de cumprir seu papel social.
ZH — Como avalia o conflito entre índios e pequenos agricultores pela demarcação de terras?
Randolfe — Enquanto
o governo não olhar a questão indígena com a prioridade que merece, o
conflito vai existir. O governo tenta acender uma vela a dois senhores.
Não se serve a dois senhores. Eles (índios) são senhores de direitos e não coitadinhos aos quais se concedem favores.
ZH
— O senhor tem atuado com o senador Pedro Simon (PMDB-RS), sobretudo no
projeto que anulou a sessão que derrubou Jango. Como tem sido essa
convivência?
Randolfe — Simon
é farol que me ilumina. Inspira desde o meu pai, que se espelhava na
atuação dele como deputado no RS. Quando cheguei ao Congresso, tive a
honra de ter o voto do Simon como candidato à Presidência do Senado
contra José Sarney (PMDB-AP). Construímos uma relação. Uma das coisas
que vou ter o prazer de contar aos netos é sobre a convivência com
Simon.
ZH
— O senhor recebeu duras críticas, inclusive no PSOL, porque o seu
candidato à prefeitura de Macapá teve, em 2012, apoio do DEM no segundo
turno. Admite que houve incoerência?
Randolfe — Não
existiu apoio do DEM a nossa candidatura. Existiu o apoio do candidato a
prefeito do DEM (que foi derrotado no primeiro turno) ao nosso
candidato, no segundo turno. O DEM, enquanto partido, esteve no palanque
do adversário. São descolamentos das pessoas para apoiar personalidades
de esquerda. Não existiu apoio do DEM. Quero deixar claro.
ZH — A Luciana Genro será candidata a vice na sua chapa?
Randolfe — Quero
unir o PSOL e a esquerda. Lamentavelmente, a Luciana não é mais
deputada. Vou ficar muito feliz se tiver competência política para
construir a chapa com ela. Seria o melhor ao partido e à esquerda. E
vamos conversar com PSTU e PCB.
ZH — Qual será o seu posicionamento diante da Copa no Brasil?
Randolfe — Vou
torcer para o Brasil, mas vou questionar muito os investimentos. Como
pode ter capacidade para fazer estádios monumentais em tão pouco tempo?
Também devemos ter a mesma capacidade para fazer em educação, saúde e
mobilidade urbana. É isso que reclama o povo. E quero questionar outras
coisas, como a facilidade que prestamos a entidades suspeitas como FIFA e
CBF. Acho inaceitável. O governo apoia a CBF.
"Como
pode ter capacidade para fazer estádios monumentais em tão pouco tempo?
Também devemos ter a mesma capacidade para fazer em educação, saúde e
mobilidade urbana" — Randolfe Rodrigues.
ZH — O senhor crê que a Copa organizará nova agenda de protestos? Poderá impactar nas eleições?
Randolfe — Torço
pela capacidade de mobilização do povo sempre. Só uma sociedade
mobilizada por direitos é que pode construir um país melhor. A Copa pode
ser um catalizador de mobilizações, sim, mas a sociedade precisa se
mobilizar pelos direitos que não estão sendo garantidos.
Entrevista concedida ao Jornal Zero Hora
BNC Eleições 2014
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