30 de setembro de 2014

O Brasil entrou mesmo em uma rota de neodesenvolvimentismo?

São Luis - Tem sido alardeado, pelo governo e por pesquisadores que se alinham política e ideologicamente com os governos Lula e Dilma, que o Brasil experimenta, principalmente a partir de 2005 um novo patamar de desenvolvimento econômico que se convencionou chamar de neodesenvolvimentismo. Na prática, esses autores afirmam que a economia brasileira rompeu com o neoliberalismo e se integrou em uma nova organização da economia que retoma o desenvolvimentismo característico do nosso processo de industrialização nas décadas de 1950, 60 e 70.
Apenas para uma breve contextualização, o Brasil passa a se integrar ao movimento geral da economia mundial em prol de uma doutrina política-econômica denominada neoliberalismo à partir do início da década de 1990 com o governo Collor. Esse padrão de desenvolvimento capitalista se desenvolveu e ganhou maturidade ao longo dos governos Fernando Henrique Cardoso. A eleição de Lula, em 2002 não representou uma ruptura com esse padrão, quando o mesmo assumiu a continuidade das políticas econômicas atreladas à esse padrão neoliberal, na famosa “Carta ao povo brasileiro”.
A aplicação do neoliberalismo no Brasil possui três características estruturais básicas: desregulamentação dos mercados e desmonte do Estado (privatizações e aumento do descontrole estatal sobre a economia); predomínio do capital financeiro (representado sumariamente pelos bancos e investidores institucionais como fundos de investimento e fundos de pensão); e vulnerabilidade externa (dependência externa).
Dessa maneira, para afirmarmos que o Brasil entrou em uma nova rota de dinâmica de sua economia, é preciso avaliar se essas condições estruturais se alteraram. Em primeiro lugar, avaliando o quesito desregulamentação e desmonte do Estado, podemos ver que o governo Lula foi o grande responsável pela reforma da Previdência, que o mesmo avançou nos debates em torno da desregulamentação do mercado de trabalho. Já no período mais recente, observamos uma nova onda de privatizações e parcerias público-privadas (o que, em nossa opinião denota a transferência da responsabilidade do Estado para a iniciativa privada mesmo em áreas estratégicas).
Já com relação ao segundo aspecto, constata-se a constância dos lucros dos bancos, o completo compromisso do pagamento dos juros da dívida pública (esse pagamento, sem uma auditoria da dívida e sustentada pelas metas de superávit primário, é um canal de transferência de recursos (de renda) do setor industrial e, principalmente das classes populares para o capital especulativo (representado pelos bancos e pelos chamados investidores institucionais). Além disso, mesmo com uma redução durante o governo Lula, a taxa de juros no Brasil continua em elevados níveis, com o pretexto de reduzir uma inflação que está em relativo controle e que não é uma inflação de demanda( como a inflação não é de demanda, e sim de custos, a manipulação das taxas de juros não é o mecanismo a ser utilizado). Essa taxa elevada eleva os ganhos do capital financeiro especulativo ao mesmo tempo que inibe os investimentos produtivos e endivida os trabalhadores.
Com relação ao terceiro aspecto, a economia brasileira tem mostrado sinais de baixo crescimento acompanhando uma tendência dos países centrais que também se encontram em situação complicada (Alemanha com baixo crescimento, China, reduzindo seu padrão de crescimento e os Estados Unidos, a despeito de uma melhora recente, vem “rateando” desde 2008). Esse aspecto, bem como as dificuldades enfrentadas nas contas externas e contas públicas, são evidências relevantes para mostrar que a economia brasileira não rompeu com sua característica de país dependente.
Concluindo, é inegável que algumas transformações (melhoria na distribuição de renda, aumento real do salário mínimo, flexibilização da política econômica) ocorreram na economia brasileira ao longo dos anos. Entretanto, em nosso entendimento, essas transformações representam apenas uma relativização frágil da aplicação do modelo neoliberal e não uma nova concepção desenvolvimentista, ou seja, rejeitamos a tese de um neodesenvolvimentismo na economia brasileira à partir de 2005.
1 Professor do curso de Economia da Universidade Federal de Alagoas – campus Santana do Ipanema

BNC Notícias

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