DORA KRAMER – O ESTADO DE SP
Alvo
da vez no meio do intenso tiroteio de denúncias, suspeições,
informações e contrainformações decorrentes da Operação Lava Jato, o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reivindica um minuto de
atenção para que se reflita sobre duas questões.
Primeira:
"Alguém em sã consciência consegue acreditar que eu possa telefonar
para o Teori (Zavascki, ministro do Supremo Tribunal Federal) pedindo
que ele aceite os habeas corpus dos advogados em favor dos clientes
presos?"
Segunda:
"Posso, por acaso, ligar para o juiz Sérgio Moro e pedir que ele
conduza o processo desta ou daquela maneira, de modo a favorecer a quem
quer que seja?"
Ele
mesmo responde: "Nem se quisesse poderia fazer nada, pois estaria me
arriscando a ser preso". Com isso, o ministro José Eduardo Cardozo quer
dizer que há mais conjectura fantasiosa (ou esperançosa) que
objetividade na suposição de que o governo possa de fato interferir nos
procedimentos de modo a evitar o avanço das investigações ou de alguma
forma anular o que foi feito até agora.
Não
que isso não possa ocorrer, mas é algo a ser tentado pelos advogados no
âmbito judicial. Olhando por esse ângulo, o ministro realmente tem
razão. Conforme noticiou o Estado na sexta-feira,
emissários das empreiteiras envolvidas têm procurado o ex-presidente
Luiz Inácio da Silva em busca de interferência política.
Mais
fácil de falar que de fazer. Se quando estava no auge, governo poderoso
com apoio político sólido, Lula nada conseguiu para salvar os
envolvidos no processo do mensalão - um caso até insignificante se
comparado com o atual -, não seria agora que teria espaço para atuações
de bastidor para lá de arriscadas.
Pelo seguinte: as investigações sobre a Petrobrás estão sendo feitas também por órgãos internacionais; a
Justiça brasileira - inclusive os tribunais superiores, STJ e STF - não
dá sinais de condescendência com os acusados e tem apoiado as decisões
de Sérgio Moro; há toda uma atmosfera de alerta contra a possibilidade
de interferência política; e, mais importante, o governo está fraco. Mal
pode com as próprias pernas. O que dirá com as dos outros.
O
ministro da Justiça apresenta sua versão sobre o encontro com os
advogados Sigmaringa Seixas e Sérgio Renault, negando que teriam
conversado sobre a hipótese de uma "operação salva-vidas". Segundo ele,
houve apenas uma troca de cumprimentos na antessala do gabinete.
Afirma
também que recebeu advogados da Odebrecht para tratar de dois assuntos
administrativos da Polícia Federal: reclamação sobre vazamentos ilegais
de informações e questionamento da legalidade de provas obtidas pelo
Ministério Público na Suíça.
Ainda
que, por hipótese, não tenha sido só isso, a confusão gerada por esses
encontros serviu de alerta para a impossibilidade prática de se
prosseguir por caminhos heterodoxos, fora do campo judicial. A
interferência, se mudar alguma coisa, é para pior.
Lula nessa seara já tem problemas demais.
Discurso da rainha. Sim,
a presidente Dilma Rousseff tem razão: se o esquema de corrupção na
Petrobrás tivesse sido investigado antes, as coisas não tinham chegado
ao ponto em que chegaram.
Ela
referiu-se ao governo Fernando Henrique Cardoso, ao qual seu partido
sucedeu, em 2003. Teve, portanto, 11 anos para pedir a abertura de
investigações ao Ministério Público, à Polícia Federal e demais órgãos
de controle.
O
que se viu, no entanto, foi a quadrilha aprofundando e estendendo seus
tentáculos debaixo dos narizes dos presidentes petistas e a presidente
até meados do ano passado negando peremptoriamente que houvesse qualquer
irregularidade na companhia.
BNC Política