Por Sakamoto
Um
dos principais fatores para impedir alguém de cometer um delito não é o
tamanho de sua punição, mas a certeza de que será pego. Com as baixas
taxas estaduais de elucidação de homicídios, por exemplo, não admira que
o fator dissuasivo não cole muito por aqui.
Por isso, é
paradoxal que políticos em campanha repitam a mesma promessa de mais
policiamento ostensivo nas ruas para combater a criminalidade. Mas não
soltem uma interjeição sobre a necessidade de melhorar a investigação
policial, com mais recursos financeiros para a área, melhores garantias
profissionais e, é claro, combate à corrupção que grassa em parte dessa
estrutura.
Atear
fogo em um ônibus com passageiros em uma avenida de grande circulação
não é um ato de loucura, mas uma ação pensada para criar pânico na
população e questionar a capacidade de controle do poder público. E a
pouca certeza de ser pego influencia nesse cálculo, claro. Cálculo que
esteve presente ao acender ônibus-tochas em cidades de todo o país no
ano passado.
O
exemplo do Maranhão é paradigmático. A penitenciária de Pedrinhas se
tornou terra de ninguém, um depósito superlotado de gente, juntando
presos de facções criminosas rivais no mesmo espaço. Daí, decapitações,
esfolamentos, estupros de mulheres da família dos presos. Mais
recentemente, demonstrações de força com a queima de coletivos nas ruas
da capital São Luís, com passageiros dentro, aprofundaram a sensação de
que a lacuna deixada pelo governo é maior do que se pensava.
Não
consigo acreditar na justificativa do poder público de que isso é uma
reação às suas políticas de segurança. Isso é uma consequência de sua
incapacidade de dar respostas.
Pois,
sobre vários sentidos, o Maranhão é um Estado seletivo: está presente
para garantir a qualidade de vida de alguns poucos em detrimento da
maioria da população.
Prova disso é que ele apresenta a menor expectativa de vida na média de homens e mulheres – 68,6 anos – de acordo com dados divulgados pelo IBGE. São cinco anos abaixo da média nacional (73,76). E possui a segunda pior taxa de mortalidade infantil do
país, apenas atrás de Alagoas, com 29 crianças com menos de um ano
mortas para cada mil nascidas vivas. A média nacional é de 16,7 para
1000.
As três piores cidades em renda per capita pertencem
ao Maranhão, de acordo com o recentemente divulgado Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) – Marajá do Sena (R$ 96,25),
Fernando Falcão (R$ 106,99) e Belágua (R$ 107,14). Na média dos
municípios, o Estado possui o segundo pior IDHM do país, perdendo apenas
para Alagoas – outra terra devastada pelo coronelismo.
O
Maranhão, sob o domínio dos Sarney por décadas, não só permaneceu nas
piores posições nos indicadores sociais, mas também viu suas terras
serem desmatadas e poluídas, latifúndios crescerem, trabalhadores serem
escravizados e assassinados, comunidades tradicionais serem ameaçadas e
expulsas, a educação ser sucateada, os meios de comunicação ficarem
concentrados nas mãos de poucos políticos. Até juiz já foi flagrado com
trabalho escravo pelo governo federal em sua fazenda, mas acabou sendo
absolvido pelos colegas por lá.
Isso
é assustador, considerando que o Maranhão é um Estado rico. Possui
jazidas minerais e gás natural. Água doce em abundância. Partes de seu
território estão na Amazônia e no Cerrado. Tem localização privilegiada,
com um porto mais próximo dos Estados Unidos e da União Europeia do que
os do Sul e Sudeste.
Por
que então não foram construídos/finalizados outros presídios antes? Por
que a polícia não foi realmente empoderada para investigar crimes e o
sistema penitenciário para gerir aquela balbúrdia? Por que recursos não
foram gastos na implementação de políticas públicas de segurança, mas
também de educação, saúde, transporte, cultura, habitação,
alimentação..?
Alguns vão colocar a culpa na própria população que os elege. Não é tão simples – Sarney teve que fugir e virar senador pelo Amapá para não ficar fora do jogo político em um determinado momento. E sua filha, Roseana, já perdeu uma eleição para o governo. Ou seja, há focos de resistência na forma de importantes movimentos sociais e uma sociedade civil cada vez mais atuante.
O
problema é o desalento de boa parte dos mais pobres, que – infelizmente
– já não acreditam que a política possa fazer diferença em sua vida.
Independentemente de quem lá estiver.
Para muita gente que vive no Maranhão, a vida se equilibra entre um “salve-se quem puder'' e um “não tenho nada a perder''. (Fonte: Blog do Sakamoto)